Como surgem os conflitos nas relações econômicas cotidianas? Quais são os caminhos trilhados pelos consumidores para garantir seus direitos? E, de modo mais amplo, o que tem a antropologia a dizer sobre os mecanismos de funcionamento do mercado e sobre as formas de intervenção do Estado nesse domínio? Estas são algumas das questões desenvolvidas pela autora a partir de uma cuidadosa etnografia sobre conflitos envolvendo relações de consumo. Como indicam os diferentes casos enfocados no livro, mesmo as transações econômicas mais fugazes pressupõem tal como na troca-dádiva analisada por Marcel Mauss alguma equivalência substantiva entre os contratantes, que tem primazia sobre os atributos dos objetos e o equilíbrio material da operação. É o rompimento dessa premissa, com a conseqüente inferiorização do consumidor diante de seu parceiro, que desencadeia o conflito e não apenas o defeito apresentado pelo produto ou serviço adquirido. Nessas condições, a deflagração do conflito pode conduzir o consumidor a um longo trajeto, no qual a reivindicação de seus direitos junto a instituições estatais ou entidades civis de defesa do consumidor é indissociável de considerações de ordem moral. Ao seguir esses trajetos, a etnografia conduz a uma compreensão original da dinâmica do mercado e dos direitos atribuídos aos consumidores pelo ordenamento jurídico. Dentre outros aspectos, a análise aponta a necessidade de relativizar o caráter instrumental e pragmático das relações econômicas e, em termos mais gerais, a descontinuidade freqüentemente acentuada entre duas modalidades de circulação de bens: a troca de dons, que vincula sujeitos enquanto sujeitos por meio de objetos; e a troca mercantil, na qual seria relevante apenas a equivalência material das coisas trocadas.